quarta-feira, 25 de junho de 2008

Intervenções Incisivas (I)


Intervenção de António Armando da Costa na comemoração do 60º aniversário da morte de Bento de Jesus Caraça no Centro de Trabalho Pedro Soares em Campo de Ourique, Lisboa

Camaradas:

Este ano de 2008 caracteriza-se por duas efemérides trágicas da nossa História: os 60 anos da morte de Bento de Jesus Caraça a 25 de Junho de 1948, e os 50 anos das eleições em que o Fascismo através duma fraude eleitoral que cobriu todo o País, derrotou o então General Humberto Delgado. Encontramo-nos aqui a comemorar a primeira destas efemérides neste Centro de Trabalho Pedro Soares do bairro de Campo de Ourique de Lisboa onde morreu, Centro que estou certo Bento Caraça muito gostaria de ter visitado, para almoçar connosco.

O camarada Bento de Jesus Caraça foi um dos maiores intelectuais portugueses do século XX. A sua acção estende-se pela actividade científica e pedagógica no âmbito da Matemática, pelo seu esforço na divulgação do Conhecimento, e pela sua actividade política no plano teórico e prático. No plano político teórico há a assinalar duas importantes contribuições para o desenvolvimento da teoria do materialismo. São elas a concepção materialista da Matemática; e o papel do indivíduo, enquanto pertença do colectivo, no desenvolvimento da História. No plano político prático foi um dos fundadores do Movimento da Unidade Nacional Antifascista (MUNAF), que, mais tarde, haveria de dar origens ao Movimento de Unidade Democrática (MUD) e distinguiu-se na sua acção em prol do Socorro Vermelho Internacional.

Nascido a 18 de Abril de 1901, na Rua dos Fidalgos, em Vila Viçosa, numa modesta dependência do Convento das Chagas, onde se alojavam alguns criados da casa de Bragança, Bento de Jesus Caraça era filho de trabalhadores rurais, João António Caraça e Domingas Espadinha. O recém-nascido era tão enfezado que as pessoas, temendo que ele morresse, trataram de o baptizar com urgência. Na falta de melhor nome chamaram-lhe Bento de Jesus, juntando Caraça da parte do pai. Viveu os primeiros cinco anos da sua vida na "herdade da Casa Branca", na freguesia de Montoito, onde aprendeu a ler e escrever com um trabalhador, José Percheiro, que para além das primeiras letras e das primeiras contas, lhe ensinou também o valor humano da solidariedade.

A extraordinária rapidez com que aprendia, impressionou a esposa de Raul de Albuquerque de quem o pai de Bento era feitor, que decidiu tomar a seu cargo a educação do jovem, sem suspeitar que estava a lançar as sementes do saber naquele que viria a ser um dos mais notáveis vultos da ciência e da cultura portuguesas.

O exame de Instrução primária fê-lo em Vila Viçosa em 1911 e depois de passar pelos Liceus de Santarém e Pedro Nunes, entrou em 1918 para o Instituto Superior de Comércio, mais tarde Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF) e hoje Instituto Superior de Economia e Gestão, tendo no inicio de dar explicações para poder custear os seus estudos. Porém logo em Novembro de 1919 foi nomeado 2.º assistente do 1.º grupo de cadeiras do ISCEF. Licenciou-se com altas classificações em 1923, tendo chamado a atenção do Professor Aureliano Mira Fernandes que promoveu a sua passagem a 1.º assistente em Dezembro de 1924, e mais tarde à sua nomeação como professor catedrático da 1.ª cadeira (Matemáticas Superiores, Álgebra Superior, Princípios de Análise Infinitesimal e Geometria Analítica) em Dezembro de 1929.

A sua entrada para o PCP não se encontra definida, mas já em 1929 afirmou: creio que a classe proletária está destinada a, num futuro mais ou menos próximo, tomar nas suas mãos a direcção dos destinos do mundo, transformando por completo toda a organização social existente. Em 1931, passou a integrar uma organização do próprio PCP, o NIS ou NTI, Núcleo de Intelectuais Simpatizantes ou Núcleo de Trabalhadores Intelectuais, o que mostra que desde a sua criação, os problemas e preocupações dos intelectuais foram assumidas pelo PCP.

A sua acção científica foi vasta: em 1936 funda o Núcleo de Matemática, Física e Química juntamente com outros recém-doutorados nas áreas da matemática e física; em 1938 com os professores Mira Fernandes e Beirão da Veiga, funda o Centro de Estudos de Matemáticas Aplicadas à Economia, que dirigiu até Outubro de 1946, ano da sua extinção pelo Governo; em 1940 com os professores António Monteiro, Hugo Ribeiro, José da Silva Paulo e Manuel Zaluar criou a Gazeta de Matemática, onde colaborou activamente, bem como nas. revistas Técnica, Gazeta de Matemática, Seara Nova, Vértice e Revista de Economia.

A sua acção de divulgação científica não tem paralelo. Em 1919 fundou a Universidade Popular Portuguesa integrando o seu Conselho administrativo, e em 1928 a respectiva Presidência, tendo procedido então a uma grande remodelação desta instituição. Em 1941 cria a Biblioteca Cosmos, para edição de livros de divulgação científica e cultural, a qual publicou 114 livros, com uma tiragem global de 793 500 exemplares. Ele entendia que o conhecimento não era privilégio de alguns, mas tinha de ser amplamente disponibilizado às massas populares.

A sua acção em prol do desenvolvimento da teoria do materialismo leva-o a esclarecer o papel do individuo na actuação colectiva visando a libertação da sociedade, nessa conferência admirável de 1933 que é A Formação Integral do Individuo Problema Central do Nosso Tempo, complementada mais tarde pela conferencia Escola Única em 1935, onde se defendiam os conceitos de escola pública universal, gratuita e de qualidade; e a publicar Os conceitos Fundamentais da Matemática, aonde lançou as bases da natureza materialista da Matemática.

Em 1946 o governo fascista pretendeu filiar Portugal na Organização das Nações Unidas. A comissão Central do MUD publicou um documento subscrito por Bento de Jesus Caraça aonde se declarava que Portugal era uma sociedade dominada por um Estado fascista que não podia aspirar a dialogar com as democracias e fazer parte de tal Organização. A ira do fascismo abateu-se sobre todos e Bento Caraça foi preso e submetido a maus-tratos pela PIDE. Foi libertado mas expulso das Universidades Portuguesas como Ruy Luís Gomes e Ferreira de Macedo, e condenado a morrer de fome. Em consequência, O Centro de Estudos de Matemáticas Aplicadas à Economia foi sumariamente extinto no mesmo ano, o que teve consequências dramáticas para o desenvolvimento da Matemática em Portugal.

Morreu de ataque cardíaco, induzido pelos maus-tratos recebidos anteriormente na PIDE, nos idos de 1946, e a 27 de Junho de 1948 foi enterrado no cemitério dos Prazeres, na sequência duma das mais poderosas manifestações anti-fascistas de sempre, e que transformaram o bairro de Campo de Ourique num mar de gente.

O Estado democrático no pós-25 de Abril atribuiu-lhe a Grã-Cruz da Ordem de Santiago de Espada, a titulo póstumo.

O legado de Bento de Jesus Caraça está hoje bem vivo do nosso Partido. Não só a formação integral do indivíduo, ainda hoje um problema central do nosso tempo, e a escola publica são duas das nossas bandeiras de luta, mas também o é o seu pensamento global de entrega do conhecimento nas mãos dos trabalhadores, e o aprofundamento do papel dos indivíduos na actuação colectiva que plasma a luta de classes no processo histórico, e que o Partido procura conduzir todos os dias. E esta maneira de proceder acompanhar-nos-á para além da vitória final.

Viva o Partido Comunista Português!

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Reflexões Estratégicas Domésticas (I)




E o Campeonato foi-se à vela!!!

Criaram-se grandes expectativas com o Europeu 2008. O povão mobilizou-se. A equipa valia milhões, afirmou-se. Continha no seu interior o maior jogador do “coicebol” contemporâneo (como chamava ao futebol Vaz Guedes, o hoquista campeão do mundo, que foi nosso professor de ginástica nos idos de 1964-65 no Liceu Nacional de Gil Vicente, quando queríamos jogar este desporto planetário). Mas depois o sonho esboroou-se. A Alemanha depois de ter ouvido o seu Hino Imperial derrotou a nossa Grande Selecção por 3-1 sem apelo. Os portugueses tinham mais uma desilusão.
Mas tudo não passa dum jogo de espelhos. Um povo definitivamente dividido entre 10 milhões de almas no solo pátrio e 4 milhões de almas forçadas a espalhar-se pelos quatro cantos do mundo para poder ter uma vida digna, tem poucos argumentos para mostrar a sua força, para além do seu apoio à sua Selecção, que é maioritariamente o espelho da divisão de si próprio como povo. Na verdade a maioria dos jogadores são emigrantes de luxo pagos a peso de ouro, pois mais ninguém é capaz de dominar a bola como eles, e em consequência criar paixões doentias. São verdadeiros malabaristas dessa coisa obscena a que alguns chamam desporto, mas que não passa de facto de um enorme espectáculo e de um dos maiores negócios contemporâneos, uma das pedras angulares da estupidificação colectiva.
Acabadas as grandes expectativas, o povo português vai agora ter de se confrontar sem quaisquer desvios com a gravíssima situação económica, social, política e cultural em que se encontra envolvido. Na verdade a burguesia nacional portuguesa largamente clientelar do imperialismo, não tem pejo, para manter os seus privilégios de degradar cada vez mais as condições de vida dos trabalhadores portugueses, pretendendo impor-lhes o Código do Trabalho. Este, a ser aprovado:

  • Consagraria ritmos de trabalho e de exploração, semelhantes aos primórdios da Grande Revolução Industrial;
  • Imporia a diminuição dos salários, com a redução neste do peso das horas extraordinárias, que ficariam à mercê do interesse dos patrões incluindo o próprio Estado, o maior violador de todas as normas laborais;
  • Submeteria os trabalhadores ao perigo de terem sempre sobre as suas cabeças a espada de Dâmocles dos despedimentos sem justa causa, que permitiria isentar os patrões de qualquer responsabilidade na contratação dos trabalhadores e do seu direito ao trabalho, como o exige a Constituição da República Portuguesa;
  • Implicaria que os trabalhadores nunca mais teriam direito a ter uma vida própria e familiar autónomas, mas estas realidades passariam a estar subordinada à gula do patronato, e às exigências da produção contínua, para aumentar as taxas de lucro.

A mesma burguesia nacional que depois de ter destruído todos os meios de ter uma produção estratégica autónoma de bens alimentares e outros, vem agora lamentar-se (coitadinha!!!) de ter sacrificado os direitos de todos nós no altar das exigências do grande capital transnacional, para poder ascender ao Olimpo da Comunidade Económica, que virou mais tarde União Europeia, e em consequência termos de pagar caro todos os desmandos que os grandes interesses transnacionais nos impuseram para limitar a nossa produção.
Em 1782 quando estava no seu leito de morte, exilado nos seus domínios de Pombal, Sebastião José de Carvalho e Melo, o injustiçado Marquês, o maior estadista europeu do Século XVIII, profundamente preocupado com o evoluir da coisa publica que uma rainha beata, cruel e vingativa impusera, ao aproximar-se a morte perdeu a consciência, variou e começou a gritar: — Portugal, à vela, à vela!!! Ele ainda não tinha visto o que um político medíocre, travestido em primeiro ministro, Socrates de seu nome, subordinado aos interesses do grande capital nacional e transnacional, violando todos os compromissos eleitorais, era capaz de fazer aos que nele confiando, o elegeram.
Por tudo isto devemos ultrapassar este interlúdio da Selecção, uma questão artificial induzida pelos grandes interesses económicos, e prepararmo-nos para, na luta, afirmarmos a existência e a dignidade do Povo Português. Afinal não é a Selecção que se foi à vela, mas seremos nós todos que iremos, seguindo a análise do grande Marquês de Pombal, e nos afundaremos sem remissão.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Acções Exemplares (I)



Salvemos o Vale e a Linha do Tua!
A linha do Tua está sob ameaça de desaparecer na sua parte final, junto à estação do Tua, pois a EDP com o apoio do Governo pretende construir lá uma barragem na sua foz.
Trata-se de um autêntico atentado paisagístico. Hoje os que viajam na linha do Douro, e passam na estação do Tua vindos de Peso da Régua, podem observar o vale do Tua visto da foz, uma paisagem única na Europa. Se a barragem for construida, o que passarão a ver é um enorme paredão de 100 metros (!!!) de altura.
Por outro lado será impossível viajar a partir da estação do Tua na direcção de Bragança, visto que a linha ficará coberta até à estação de Santa Luzia. A produção de Vinho do Porto está em perigo nesta zona. Nunca mais será a mesma coisa. Só as nossas recordações restarão, com a cultura ancestral esmagadas por desalmados interesses económicos, ao serviço do lucro obtido de qualquer maneira, e de duvidosa qualidade humana, cultural e ambiental. É isto que temos de impedir.
As fotos juntas, com excepção da Estação de Santa Luzia, mostram troços que serão inexoravelmente submersos pelas águas da albufeira:


Veja o portal http://www.linhadotua.net/ e junte-se aos milhares que já protestaram assinando a petição em
http://www.petitiononline.com/tuaviva/petition.html

Não permita que um crime ambiental e cultural seja cometido. Se perdermos a Linha do Tua e a beleza do vale aonde ela existe, será um facto irreversível e não temos outros semelhantes para o substituir!!!