terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Cartas Escocesas (VI)

Escândalo na Câmara dos Comuns Britânica

Um grande escândalo acaba de atingir duma forma grotesca a mais antiga forma parlamentar conhecida, a Câmara dos Comuns do Reino Unido. No passado dia 27 de Novembro o deputado do Partido Conservador Damien Green foi detido em sua casa, algemado, e ficou preso durante 9 (nove) horas, durante as quais foi interrogado pela polícia. Durante este período a sua casa e o seu gabinete no Palácio de Westminster, sede da Câmara dos Comuns foram sujeitas buscas policiais, e computadores e telemóveis foram apreendidos.

Esta acção sem precedentes na vida pública britânica foram motivadas pela divulgação da incapacidade do Home Office em controlar a imigração ilegal, que este pretendia manter secretas, e que Damien Green ajudou a tornar públicas usando informadores. O Home Office declarou que Damien Green tinha ajudado, encorajado, aconselhado e outros “ados” usando o seu posicionamento público. Porém Damien Green afirma que ao denunciar as formas pouco ortodoxas do Home Office mais não fez do que exercer as suas funções de deputado, que são as de controlar parlamentarmente o Governo.

O assunto assumiu formas caricatas e preocupantes quando se soube que para revistar o gabinete da Câmara dos Comuns e apreender material, a Policia se apresentou no Palácio de Westminster, e não cumpriu as determinações legais nestas questões, e.g. a apresentação dum mandato de busca e apreensão de material. Também não foram tomadas as medidas adequadas para garantir a informação secreta disponibilizada aos Deputados e que agora sabe-se lá por onde andará. Por outro lado houve uma estranha disponibilidade para cumprir sem questionamento as exigências da policia, da parte da mais alta entidade de segurança da Câmara dos Comuns, The Sergeant in Arms, e do próprio Speaker (Presidente) da Câmara.

Entretanto a Ministra responsável pelo Home Office assobia para o lado, garantindo que não sabe de nada, e que não está nos seus hábitos pôr em causa a operacionalidade da polícia. Mas a verdade é que as liberdades foram ofendidas, pois o Governo nem sequer pode invocar este caso o Official Secrets Act, pois esta matéria não cai na sua alçada.

Várias investigações estão em curso para saber como tudo isto aconteceu, pois todos pensam que isto seria mais próprio do Burkina Fasso, do que da velha Albion. Vários deputados não gostaram das declarações do Speaker e exigiram a sua demissão, pela sua falta de espinha dorsal para defender a liberdade democrática dos deputados. Ninguém se preocupa tanto quando a polícia é usada como arma para actuar sobre grevistas obedecendo a ordens do Governo ou patronato, para quebrar a espinha à luta dos trabalhadores, como na Greve dos Mineiros em 1984. Ora tudo isto é consequência de várias questões:

·         Da inexistência de leis escritas sobre estas matérias, e que agora estão a ser exigidas, e.g. uma Carta de Direitos (Bill of Rights) pois o famoso Gentleman’s Agreement característico duma certa forma de fazer política de classe, foi inexoravelmente ofendido;

·         Da forma arrogante como actua a policia deste país, pois ela atribui-se o direito de prender um deputado durante 9 horas, da mesma forma que se atribui o direito de parar no meio da rua um pacato cidadão, eventualmente negro, exigindo-lhe a identificação, mesmo que ele não esteja a fazer nada que possa sugerir um futuro acto criminoso.

Vamos ver o que isto vai dar. Mas na verdade a forma irrepreensível da vida democrática britânica ficou irremediavelmente manchada, como já tinha sido antes quando foram reprimidas as justas lutas dos trabalhadores, e a policia usada como cão de guarda do grande patronato. Aguardemos pelos próximos episódios.

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