terça-feira, 13 de setembro de 2011

Notas Gastrológicas II

Cidade de Mirandela1E da luta nasceu a alheira, a suprema maravilha gastrológica…Cidade de Mirandela Mapa

O espectáculo que decorreu na passada 6ª feira na cidade de Santarém para proclamar as 7 maravilhas gastrológicas de Portugal, teve um resultado inesperado. Os portugueses e portuguesas foram convocados para votar num conjunto de iguarias que eles reputavam ser dignas de figurar num conjunto de 7. A escolha não era aleatória, mas tinha de ser feita na base de 21 iguarias, espartilhadas em 7 categorias.

E quando foi anunciado o resultado final verificou-se que a entrada escolhida era a humilde alheira de Mirandela. Mais, soube-se depois que tinha sido a iguaria mais votada, tornando-se assim a suprema maravilha gastrológica deste infeliz país. Mas afinal que especialidade é esta?DSC_0017

No tempo da Inquisição os judeus tornados cristãos novos à força, fugiram para Trás-os-Montes aonde tinham que provar que eram bons cristãos, comendo enchidos, que naquele tempo continham porco. Mas eles criaram um enchido novo, a alheira, que não continha porco, embora parecesse que sim. Continha carnes permitidas pelo Judaísmo, mas não porco, e tinha um sabor divinal. Muito tempo depois os verdadeiros cristãos começaram a fazer alheiras, mas estas com carne de porco. E assim se desenvolveu uma iguaria.

Alheiras há-as por todo o Trás-os-Montes e Alto Douro mas as de Mirandela são as que mais contam. A questão é ter um porco que se mata e depois utilizam-se as carnes e fazem-se as alheiras. Claro que é preciso muito mais do que isto: ´é preciso a ancestralidade de muitas gerações aonde as alheiras ajudaram a matar muita fome, uma dura realidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.DSC_0017a

E foi com este património secular que a Câmara Municipal de Mirandela mobilizou interesses vários nas humildes alheiras. Longe vão os tempos em que as alheiras eram simplesmente artesanais, produto duma actividade familiar: hoje são uma poderosa industria que procura manter um sabor artesanal. Todos se mobilizaram. O objectivo era pôr Mirandela e Trás-os-Montes no mapa. E conseguiu-se.

Quando os resultados finais foram anunciados Mirandela, a Princesa do Tua, irradiava no mapa. Homens e mulheres que acreditaram tinham feito um milagre: aliás tinham-se superado, pois não só tinham atingido o objectivo de fazer da alheira uma maravilha gastrológica, mas essa maravilha tinha sido considerada a suprema entre elas. Como diria D. Nuno Álvares Pereira metera-se uma lança em África.

E assim a alheira é, nunca é de mais repeti-lo, a suprema maravilha. As outras são muito interessantes, umas incontroversas, outras nem tanto. E assim recordaremos uma noite que pôs definitivamente no mapa Trás-os-Montes e Alto Douro, a centralidade periférica que temos de construir com urgência, se não dentro de 100 anos Trás-os-Montes e Alto Douro não existe.

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