terça-feira, 24 de março de 2009

Cartas Escocesas (XII)

A Liberdade de Expressão no Reino Unido

O jornalista José Eduardo Moniz afirmou recentemente: — Há quem considere que, em democracia é possível condicionar o livre exercício do jornalismo. Pois parece que aqui no Reino Unido, o berço da democracia, há quem pense que tal não só é possível, como pratique os actos necessários a fazê-lo impunemente.

Neste tempo de crise, o jornal The Guardian, tem-se lançado numa cruzada para descobrir todas as grandes malfeitorias que foram sendo praticadas pelo capitalismo moribundo, quando ainda estava extremamente viçoso. E tem descoberto coisas assinaláveis: as zonas francas por onde o dinheiro circula para não se pagarem impostos, e depois quando falidos as verbas que exigem para ser salvos; os esquemas que permitem que as grandes multinacionais deixem de pagar impostos aos países em vias de desenvolvimento, e por isso mesmo os condenem à pobreza perpétua; os bónus que as multinacionais, e em particular os bancos pagam aos seus administradores, particularmente quando vão à falência.

Tudo isto tem sido corrente nos últimos números do The Guardian. Dois bancos têm sido singularizados, o Royal Bank of Scotland, e o Barclays Bank. A tarefa do jornal foi particularmente simplificada em relação a este último, porque um funcionário do Barclays ao ser despedido trouxe consigo uma vasta quantidade de informação, que mostrava que este banco era uma maquina de evasão fiscal através de varias companhias através do mundo, e.g. zonas francas, tendo conseguido não pagar vários milhares de milhões de Libras, e entregou-a ao The Guardian.

O jornal que é de esquerda, embora muitas vezes seja sensível à política de direita, tratou de denunciar tudo, colocando os documentos no seu portal da internet, http://www.guardian.co.uk/. E então sucedeu o inacreditável, porque o capitalismo, depois de ir ao tapete, começou a berrar que tudo ir ser transparente. Por via disso meteu alguns trastes na cadeia, como o banqueiro Madoff que, nos USA, construiu uma pirâmide financeira, do género Dona Branca, e assim derreteu qualquer coisa como 36 milhares de milhões de dólares de vários investidores.

Pois aqui no Reino Unido o o Barclays conseguiu que na 3ª Feira dia 16 de Março, um juiz às 2 horas da manhã acordasse o advogado do jornal comunicando-lhe que o Barclays tinha submetido uma providencia cautelar para que os documentos gravosos deixassem de estar em circulação, pois segundo o banco tal prejudicava-o, e para lhe fazer umas quantas perguntas antes de tomar a decisão. A mesma foi impedir o jornal de continuar a informar sobre esta questão, retirando todos os documentos da internet, e submeter a questão ao tribunal, que a veio a confirmar na 5ª Feira, dia 19 de Março. Entretanto outro desconhecido funcionário tornou pública mais documentação.

Como se vê o jornalismo de investigação está sob ataque e não há interesse publico que lhe valha se estiverem em jogo os altos interesses privados, ao contrário do que afirma José Eduardo Moniz. Não interessa se estas estruturas prejudicam o Estado em biliões de libras, e por esse facto todos nós estejamos a ser prejudicados. O que é preciso é permitir que eles continuem a funcionar como se nada se passasse, e a serem salvos à nossa custa dos impostos, não dos deles, mas os nossos.

Estes edificantes acontecimentos mais vêm colocar a necessidade de se correr com estes trastes, pois podem ser muito tecnicamente capazes, mas os seus valores éticos impedem que eles continuem à frente do que quer que seja, e exige-se que quanto antes sejam lançados no caixote do lixo da História. Estas são medidas necessárias a uma democracia avançada neste Século XXI.

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